resenha escrita por Tathy Zimmermann
Rose é uma feliz dona de casa, ex-professora de matemática, que dedica a vida ao lar e à sua família: o artista plástico Garreth, a pequena Anna e a recém-nascida Flossie. A família mora em um chalé, na área rural da Inglaterra, que foi restaurado pelas mãos dos próprios proprietários, Rose e Garreth, com ajuda de Andy, irmão de Garreth.
O casamento não
é perfeito e ambos já passaram por momentos difíceis: no início da vida juntos,
quando Garreth lutava para ser reconhecido por sua arte, Rose segurava as contas
da casa dando aulas e, quando Anna nasceu, ambos passaram por problemas
financeiros sérios, morando em um quartinho em um bairro perigoso.
A situação
financeira do casal melhora após a morte dos pais de Rose, que lhe deixam uma
herança que proporciona a compra do chalé. Eles reformam a casa, se mudam e o
trabalho de Garreth começa a alcançar um bom preço no mercado. Finalmente a
vida está melhorando, pensa Rose, finalmente pode aproveitar uma noite ao lado
do marido, tomando um bom vinho em sua cozinha dos sonhos...
Mas essa
tranquilidade está prestes a acabar! Nessa mesma noite, Rose recebe um
telefonema de Polly, sua amiga de infância, com a terrível notícia de que seu
marido, o artista plástico e melhor amigo de Garreth, Christos, morreu em um
terrível acidente de carro. Polly não aguenta mais ficar perto da família de Christos,
na Grécia. Ela e os meninos, Nico e Yannis, estão tristes, desamparados e desesperados.
Mesmo sabendo que Garreth não gosta de Polly, Rose insiste em que ela e os
meninos seriam bem-vindos a passar uns dias com sua família, até tudo se
ajeitar.
Polly faz as
malas e logo já está se instalando na edícula do chalé de Rose e Garreth. Desde
o início, Rose percebe que sua melhor amiga é uma mãe relapsa ou que está
triste demais com a perda do marido para se preocupar com os próprios filhos.
Rose toma para si a responsabilidade dos meninos: levá-los para a escola,
cuidar de suas roupas, já que os meninos não tinham vestimentas adequadas para
o clima inglês, e alimentá-los. Rose, aliás, se torna uma grande mãe de todos,
cuidando do bem-estar dessa grande comunidade que se mantém em um clima tenso.
Por um lado, a agressividade dos meninos fere a sensibilidade de Anna, por
outro, Garreth passa horas no estúdio para evitar se encontrar com Polly, que
por sua vez perambula pela casa em camisolas transparentes, dorme o dia todo,
fuma e bebe todas as noites.
Polly é uma ex-cantora
famosa e ex-drogada, que largou a fama, o glamour, as drogas, as bebedeiras e o
sucesso ao conhecer Christos e mudar-se com ele para a Grécia. Garreth a
detesta, por tudo o que ela representa e, principalmente, por ter afastado seu
melhor amigo dele. Rose tem verdadeiro fascínio por Polly, mas também há um
pequeno desconforto, pois Rose se apaixonou por Christos e quando ele conheceu
Polly, ambos ficaram juntos. Além disso, há segredos compartilhados desde
criança, coisas que Garreth nem pode desconfiar, e as atitudes de Polly deixam
claro que Rose está em suas mãos. Rose começa a se perguntar o quanto pode
confiar em sua amiga e o quanto a conhece de fato. E começa a sentir que
cometeu um grande erro e fica dividida entre ajudar a amiga ou mandá-la embora
de sua casa. Porém, enquanto Rose perde o controle de sua família e de sua
casa, seu mundo começa a ser destruído e fica cada vez mais difícil de se
livrar de Polly.
***
A história é
narrada em terceira pessoa, mas poderia ser escrito em primeira pessoa já que
aborda apenas o ponto de vista de Rose, deixando um grande vazio sobre o que
ocorre com os demais personagens. A autora poderia ter deixado que o leitor
entendesse o que estava acontecendo dentro de cada personagem, poderia nos
mostrar o lado de Polly, quão profundo era seu sentimento pela perda do marido,
qual o motivo de simplesmente largar os filhos sem nenhum cuidado ou
preocupação.
Apenas no
final do livro Polly dá a entender que sabia do romance entre Rose e Christos,
mas quais as suas motivações, o que a levou a destruir deliberadamente a vida
da sua melhor amiga?
E quanto a
Garreth? Um artista plástico que não fala sobre seu trabalho, que se fecha dias
e dias no estúdio e mal comenta com a esposa no que está trabalhando. Demonstra
verdadeiro repúdio contra Polly e essa atitude muda repentinamente, sem dar ao
leitor uma brecha para saber como. Os personagens são densos e bem construídos,
mas poderiam ter sido mais bem trabalhados ao longo da narrativa.
O ritmo da
narrativa é bastante interessante no início, quando ocorre muita ação, mas com
o passar das páginas, o ritmo desacelera e chega a ficar monótono. A personagem
principal toma decisões questionáveis o livro todo, ela é fraca, indecisa,
manipulável e acomodada e deixou que as coisas acontecessem com ela e com sua
família sem tomar uma atitude, mesmo com os amigos alertando para o perigo que
ela estava correndo. Mesmo quando sua filha recém-nascida corre risco de morte,
ela prefere acreditar em Polly e, quase literalmente, joga seu marido para cima
da amiga.
O final do livro é
decepcionante, quando a trama volta a ficar eletrizante, a autora joga um balde
de água fria sobre o leitor e encerra com um simples “dois anos depois”, sem
explicar como e o que aconteceu nesse meio tempo, fornecendo o final
previsível, que sugere que a personagem principal realmente é uma mulher que
não sabe proteger sua família e as coisas que lhe são caras na vida. Como se
ela estivesse no mundo para ser o capacho de Polly. É um livro que vale a pena
ler pela profundidade e densidade de seus personagens e como um bom exemplo de
como estragar uma boa trama e bons personagens com uma narrativa que não os
deixa aparecer.
***
A autora,
Julia Crouch, cresceu em Cambridge e estudou arte dramática na Universidade de
Bristol. Trabalhou como dramaturga e diretora de teatro, formando-se também em
designer gráfico, fazendo seu mestrado na área de ilustração sequencial. Cuco
foi seu primeiro romance e a trama bem elaborada tinha tudo para ser perfeita,
entretanto, a autora não soube explorar a profundidade de seus personagens.
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